Querida Betty,
Você nunca vai ler isso, e provavelmente não chegou a ler a carta que mandei em fevereiro. Era uma carta bem idiota, e talvez qualquer uma que eu escreva seja idiota. Já dizia alguém que as cartas de amor são todas ridículas, e que os mais ridículos são os que nunca as escreveram. Qualquer coisa que eu vá a escrever nunca vai descrever o quanto eu te amo e admiro, mas não custa tentar.
O primeiro filme que eu vi com você foi Como Agarrar um Milionário, e eu vi por causa da Marilyn, uma das minhas primeiras paixões vendo filmes clássicos, mas vendo aquele filme eu mal esperava me apaixonar novamente, e foi por você, a sua voz (se eu tivesse a sua voz, jamais pararia de falar na vida), o seu charme, seus olhos, sua presença, seu humor e talento infinito. Aliás todo o elenco daquele filme estava perfeito, Monroe, Grable, Powell, é sem dúvida um dos meus preferidos sempre. Eu o vi num domingo de madrugada no TCM, quando ainda se passavam clássicos, mas isso também já é passado. Mesmo que seja, eu nunca esqueci.
Mas acho que eu realmente me apaixonei de verdade no dia que eu vi Uma Aventura na Martinica, que você fez com aquele ''old fellow what's-his-name in African Queen'' chamado Humphrey Bogart, que eu já gostava muito, desde que vi Casablanca e chorei vendo Ingrid Bergman partir com Paul Henreid num avião e com ele enchendo a cara ao som de As Time Goes By tocada no piano pelo Sam, e tantos outros momentos, que provavelmente me farão chorar ainda mais quando os rever. Além de O Falcão Maltês, que também vi no TCM numa das diversas madrugadas que perdi (ou ganhei) vendo todos esses filmes que são tão importantes pra mim como o ar que eu respiro agora com dificuldade diante do choque, e as lágrimas que temem cair, mas logo sucumbirão numa cachoeira inevitável.
A sua aula de como assobiar talvez seja a melhor que já assisti (put your lips together and blow), e mesmo que digam que a sua voz é péssima, eu adoro quando você canta e dança no piano naquele filme (assim como seu número que adoro, Heart No Diamonds, em The Fan), e a química explosiva entre você e Bogie, talvez meu casal favorito em todo o cinema. Depois eu vi À Beira do Abismo e também entrou nos meus favoritos logo de cara. Me perguntam porque tantos filmes são meus favoritos, e eu digo que cada um não é apenas mais um número, cada um significa o mundo pra mim, mesmo que seja uma cena, um detalhe, o que for, eu carrego todos eles no meu coração pra sempre. E mesmo que eu tenha visto À Beira do Abismo mil vezes e nunca tenha entendido coisa alguma do enredo (acho que ninguém nunca entendeu direito, nem você ou quem o escreveu) é de longe um dos melhores Noir que eu já vi. Eu o vi novamente ... no TCM rs, e foi em 2011. Foi há um tempo, mas não importa, vai durar pra sempre.
Teu Nome é Mulher, Assassinato no Expresso do Oriente, Paixões em Fúria, Prisioneiro do Passado, Louca Obsessão, O Fã, Palavras ao Vento, Êxito Fugaz (eu amo a química entre você e Kirk), O Mundo é das Mulheres (que na última carta eu ainda não tinha visto, mas amei demais e mal esperava pra escrever outra carta pra falar o quanto gostei, e mencionar mais filmes que eu tinha visto, aliás desde que mandei aquela carta eu não paro de ver seus filmes, e agora eu não sossegar enquanto não terminar a sua filmografia que é tão maravilhosa, assim como seu legado que jamais será esquecido, muito menos por esse fã que lhe escreve e te ama tanto).
Eu fui sincero e disse que não tinha lido sua autobiografia, mas agora o que mais quero é ler todos os livros que você escreveu e te conhecer ainda mais. A cada dia que passa eu sei algo novo sobre você e minha admiração cresce infinitamente. O título aqui no Brasil é Bacall Fenomenal e eu acho que não havia título melhor, apesar de um tanto tosco. Você é e sempre será um fenômeno.
Betty, desde 2010 eu sou apaixonado por filmes e desde aquele dia a minha vida tem sido como sua última cena em Key Largo: quando todo o conflito acaba, você abre a janela do hotel e deixa toda a luz entrar, e o que antes estava dominado pelas trevas, se enche de luz. E você olha o horizonte, provavelmente à espera de Bogart, que sorri enquanto pilota o barco de volta à terra firme, não vendo a hora de ter você em seus braços. Todos os filmes, todas as estrelas da Golden Age que conheci desde então são aquela luz, que ilumina minha vida, e por maior que seja a escuridão desse mundo, eles sempre serão a minha luz. E eu tenho certeza que nesse momento você está nos braços de Bogie, um lugar muito melhor do que este mundo que mal vejo a hora de deixar, para poder me encontrar com todas as estrelas que tanto amo. Até lá, eu espero ter visto todos os filmes que quero, e principalmente, viver a vida com tanta paixão quanto você viveu a sua, e saiba que você me inspira de tal maneira que me faz querer crescer e me tornar alguém melhor sempre. Eu espero ser uma pessoa incrível, assim como você o foi, é e sempre será.
Obrigado por ser uma inspiração e por tudo.
O melhor de tudo sempre
Pedro
São Paulo, 2014